terça-feira, 27 de dezembro de 2011
A 308 e seu legado.
Todos os que já se aventuraram pelo mundo do Parkour alguma vez, sabem a importância que um determinado lugar ou ambiente da a um treinamento. Bom, no meu caso, toda vez que penso em um lugar de treino, a primeira coisa que me vem à cabeça é um pico chamado 308 sul, localizado na minha cidade, Brasília.
Desde a primeira vez que pisei na 308 com o intuito de treinar, logo senti que ali havia algo de especial. Talvez agora que não estou vivendo mais em Brasília, mas apenas passando as férias, eu perceba isso com mais clareza. Mesmo que seja uma região com uma característica mais plana, sem grandes alturas e grandes desafios aos olhos de todos, é um ambiente que transmite uma paz impressionante quando se está treinando, e isso estando no coração de Brasília.
É verdade que toda a cidade de Brasília é repleta de lugares que transmitem uma tranqüilidade e oferecem uma arquitetura propicia ao Parkour, talvez tudo isso esteja muito relacionado também a quantidade de árvores e verde que existe por toda a cidade, também aos grandes espaços. Mas também não posso negar que a 308 foi uma região que se destacou entre todas as outras quando falamos do Parkour Candango. Nunca deixei de ter certeza que a relação do Parkour com a 308 cumpre o propósito dos idealizadores desse lugar, mas talvez não da forma que imaginavam.
Na Europa vi picos incríveis, repletos de muros, e passarelas de todas as formas, ambientes que ao olhar você poderia ter a certeza que foi feito especialmente para praticar o Parkour. Mas agora, ao voltar a minha cidade e reencontrar a 308, posso dizer que ela para mim é o melhor lugar para se treinar Parkour no mundo. Talvez as pessoas pudessem me xingar agora por eu dizer isso, e até mesmo argumentarem citando alguns picos famosos do Parkour, como a Dame Du Lac em Lisses, a cidade de Evry, ou até mesmo picos famosos na Inglaterra. Mas para mim a 308 continuaria sendo o melhor lugar para treinar.
Lembro até hoje de meus primeiros movimentos naquelas árvores tortuosas que parecem ter sido milimetricamente feitas para nós praticantes de Parkour. Não faltam alternativas de movimentação, tanto que até hoje praticantes criam novas possibilidades quando todos acham que já não há mais nada a se criar. Lembro bem de meus primeiros saltos mortais saindo dos cogumelos de concreto e aterrissando naquela areia não muito macia. Me lembro bem das infindáveis repetições e desafios naqueles muros que parecem mais terem sido feitos por cacos de vidro, mas que forjam mãos incrivelmente fortes e resistentes para a prática do Parkour. Canteiros de concreto que mesmo sem muita altura, te oferecem diversas opções de distancia para um salto de precisão . Não poderia deixar de citar a Escola de Jardim de Infância situada no meio da quadra. Os que já subiram na laje, sabem que ali se pode passar o dia todo treinando sem descer (Mas cuidado com o zelador, ás vezes ele está por lá e nem sempre ele está de bom humor). Os mais sabidos sobem lá apenas em dia de domingo.
Não poderia me esquecer do movimento de pessoas que existe ali. Normalmente gente alternativa que gosta de passar um tempo abaixo das arvores sem fazer nada, fumando ou bebendo. Outros que vão ali só para fazerem necessidades atrás de uma moita, assim tornando um local não sempre com um bom cheiro. Eu e meus amigos costumamos dizer que quem treina na 308 está preparado para tudo, até mesmo para doenças, já que convivemos sempre com essa sujeira humana e nunca pegamos nenhuma doença. Mas posso admitir que a 308 tem estado mais limpa e mais bem freqüentada, pelo menos nas ultimas vezes que estive lá. Já me aconteceram coisas bem marcantes em relação a isso, como ter que levar pontos no braço por conta de um corte que sofri ao cair em cima de um vidro deixado por la, ou escalar uma árvore e perceber que ao tocar um tronco, havia tocado também em um coco humano por ali.
Bom, eu poderia ficar aqui contando muitas histórias e falando o quanto a 308 é especial para mim. Posso dizer que foi principalmente ali que o velho Pedro foi morrendo aos poucos, e um novo Pedro começou a nascer, ou melhor, foi ali que comecei a conhecer quem realmente é o Pedro. Mas tenho certeza que nada disso que falei até agora teria sentido se não houvesse as pessoas com quem compartilhei todos esses momentos genuínos, e que hoje são todos meus amigos. Os risos, os desafios, os treinos mais sérios, os não tão sérios, até mesmo os nada sérios. Ali pude compartilhar uma amizade verdadeira com muitos, uma amizade sem interesses, sem intrigas e problemas, apenas a paixão pelo movimento e pela vida. Ali era nosso local sagrado, nosso refúgio de um dia-dia cheio de problemas. Talvez seja por isso que os considero todos eles meus amigos, mesmo sem as vezes conviver muito fora daquele momento de treino. E isso porque sei que para 308 não levávamos problemas e negatividade, levávamos apenas nós mesmos, e por isso acabávamos compartilhando apenas momentos verdadeiros e evoluíamos juntos.
Bom, a razão inicial desse texto talvez seja a minha vontade de que esse espírito continue por lá, mesmo no dia em que nenhum de nós estivermos mais presentes. Gostaria de encorajar a todos os que estão começando a treinar por lá agora, que saibam oque esse lugar representa para muitos que treinaram ou treinam ainda por lá. E mesmo que se um dia a 308 não exista mais, que se lembrem do espírito de amizade e alegria mas também de treino e evolução que um dia existiu no Parkour de Brasília.
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2 comentários:
E é a isso que nos referimos quando dizemos que o parkour modifica a forma como enxergamos o meio a nossa volta.
Tentando enxergar de fora, é tão simples tudo né? O espaço é o mesmo para todos, porém são poucos capazes de enxergá-lo além do que os olhos mostram.
Isso configura arte.
É, Santigas. Também vivi muitas coisas muito boas, livres e desprovidas de qualquer negatividade. Amo esse lugar também pelos mesmos motivos! Parabéns pelo texto, me vi nele também rsrs
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