The Split (A divisão) - Por Stephane Vigroux
Sendo
francês e desenvolvendo meu Parkour em Lisses com David Belle (começando em
1998) me considero alguém de sorte por ter feito parte do nascimento do Parkour.
Eu tive a rara oportunidade de treinar e aprender em um tempo em que aquilo que
fazíamos era completamente desconhecido para o mundo : Somente alguns jovens
loucos treinando “algo’’ em uma pequena cidade. Sem o interesse da TV, dos
jornais, sem as câmeras, sem a internet, ali havia somente a cidade, nossa busca
por identidade, nossos medos, corpo e alma desejando desafios, autoconhecimento
e crescimento.
Depois
de um tempo, eu naturalmente senti o desejo de ensinar e compartilhar alguns
dos conhecimentos que recebi treinando com aqueles que foram minhas grandes inspirações
dentro da prática : David Belle, Sebastian Foucan e Williams Belle.
Passando
esse conhecimento adiante e conhecendo as novas gerações de praticantes eu
rapidamente percebi algo: O Parkour está evoluindo, mudando, e parte dele está
sendo diluído. Está sendo criada uma tendência e uma mentalidade separada da
original.
Eu pensei
que estaria tudo bem desde que conseguíssemos manter o espírito e a essência do
Parkour vivos. Tentamos sempre conservar a idéia de que nessa prática há espaço
para todos nós, que somos homens e mulheres livres para pensar e fazer as
coisas como desejamos. Eu costumo tentar focar naquilo que temos em comum, nas coisas
que podemos compartilhar, similaridades em nossa forma de movimentar, treinar e
viver. Ao invés de dividir nossa comunidade, ainda mais se considerarmos que o
Parkour é, todavia algo muito recente, um movimento que ainda está em
desenvolvimento.
E
então, por isso, minha mensagem durante os 5-6 últimos anos foi bem voltada
para a construção de uma federação ; enxergando toda a comunidade como UM só
movimento que deveríamos desenvolver todos juntos. Essa intenção foi boa, eu
acho, pelo menos no começo.
Muitos
anos já passados, hoje posso dizer que já trabalhei perto de boa parte da
comunidade mundial de Parkour. Eu tive muito tempo para observar o crescimento
e a evolução dela, e por isso acabei chegando a uma conclusão, e hoje posso
dizer honestamente que essa multidão “Redbullion’’ (um termo criado por
Sebastian Foucan para descrever esse vírus que está diluindo nosso movimento) e
aqueles que treinam para aparecer em vídeos, esses NÃO fazem Parkour ! Eles NÃO
estão treinando a mesma disciplina que nós desenvolvemos na França todos esses
anos.
Mesmo
que os saltos sejam os mesmos em um vídeo, e visualmente seja a mesma coisa, o
significado por trás desses saltos, a razão e motivação para fazê-los, o estado
de espírito quando eles estão sendo feitos e a intenção por trás, são em essência
completamente diferentes daquilo que fazemos. Parkour não é, e nunca foi,
acrobacias aleatórias em muros. O que realmente importa, aquilo que trará
benefícios ou prejuízos para cada um, é aquilo que está por trás da performance
propriamente dita. Eu posso ver uma separação real ocorrendo nesse sentido com
essa nova geração tentando praticar Parkour.
Deixe-me
explicar o que Parkour realmente é: Parkour é uma prática baseada no movimento que ajuda as pessoas a se tornarem mais fortes fisicamente e mentalmente, os tornando seres
humanos mais equilibrados. E assim, com essas bases sólidas estarão preparados para ajudar outras
pessoas e a comunidade a sua volta.
É uma
definição muito ampla e eu tenho certeza que muitos devem estar pensando : ‘’Beleza,
esse ai sou eu, estou praticando o verdadeiro Parkour’’. Mais sugiro a você que
pense por uma segunda vez. Detalhes fazem realmente a diferença. Parkour é uma
MENTALIDADE. Um estado de espírito, uma cultura de trabalho duro e esforço, são
essas coisas que fizeram a atividade existir em primeira instância. Sem essa
mentalidade, se a prática tivesse sido criada sendo baseada somente em um terrível
vazio, com eventos e mensagens superficiais representadas pela mentalidade da
Redbull, o Parkour nunca teria nascido.
Mais
uma vez eu repito, visualmente parece tudo a mesma coisa, mas aquilo que está
acontecendo por trás de cada salto dentro da mente de cada praticante, é para
mim o que define se ele está praticando Parkour ou não. É uma mentalidade que
você pode encontrar em muitas pessoas e atividades diferentes, e ela é a
essência do Parkour. E não o maldito salto !!
O
Parkour deve ser mais pessoal, focando no trabalho interior que cada um precisa
fazer para se tornar mais forte de diversas maneiras possíveis, não somente no aspecto
físico. Essa é a mentalidade. E você pode encontrar essa mentalidade na
pintura, na escrita, nas artes marciais, etc. Na verdade em tudo que fazemos.
Conversando
com meu amigo Ido Portal recentemente, confirmei isso. Realmente não se trata
daquilo que fazemos, mais COMO fazemos as coisas. Com qual intenção e estado de
espírito me sinto mais próximo e me identifico com pessoas que praticam
qualquer outra atividade de mentalidade similar, do que com qualquer outro tipo
Redbullion que eu possa conhecer.
Quando
eu navego pelo Youtube e digito ‘’Parkour’’ ou ‘’FreeRunning’’, eu não consigo
me identificar ou me sentir próximo em 99.99% das vezes. Por quê? Interiormente,
o que fazemos é completamente diferente. Enquanto no Parkour estamos tentando
entender mais sobre nós mesmos, ganhar mais confiança, ser alguém mais feliz,
ser mais forte de diversas maneiras na vida, outras parte de praticantes está
alimentando seus próprios egos com performances de curto prazo que só irá os
levar a mais sofrimento e, finalmente, ao fim de seu movimento e de sua boa
saúde.
Há uma
clara DIVISÃO entre o que praticamos agora. A palavra Parkour tem sido usada
demasiadamente e equivocadamente. Tem perdido sua força e significado. A
identidade do Parkour tem sido roubada e explorada. Essa nova mentalidade está hoje representando tudo que nós lutamos contra no inicio, durante a criação do
Parkour. Essas grandes marcas vendendo nossa própria cultura de volta para nós
mesmos, prendendo-nos no consumo de seus produtos, tentando nos possuir e
abusar da imagem do Parkour para promover bebidas energéticas, cassinos,
ginásios fechados...Quanto mais você seguir esta mentalidade, menos você é
livre e forte.
Isso é bastante preocupante se você parar para pensar. Essa nova mentalidade é justamente o oposto daquilo que deu origem ao Parkour !! Depois de fazer um pouco de pesquisa eu encontrei um monte de pessoas "descontentes" com as campanhas maçantes de organizações como a Redbull dentro do mundo do skate e também no entre os artistas de graffiti. Puristas, talvez sim, porém são pessoas muito atentas em não serem exploradas, que promovem ações para lutar contra essa grande maquina que está roubando deles também.
Isso é bastante preocupante se você parar para pensar. Essa nova mentalidade é justamente o oposto daquilo que deu origem ao Parkour !! Depois de fazer um pouco de pesquisa eu encontrei um monte de pessoas "descontentes" com as campanhas maçantes de organizações como a Redbull dentro do mundo do skate e também no entre os artistas de graffiti. Puristas, talvez sim, porém são pessoas muito atentas em não serem exploradas, que promovem ações para lutar contra essa grande maquina que está roubando deles também.
Eu realmente me sinto muito triste pelo meu amigo Sebastien Foucan, aquele
quem começou a se comunicar com o mundo através da expressão ‘’Free Running’’,
logo depois do documentário Jump London : A definição original para essa
palavra também foi perdida e devorada por esse grande parasita, e agora serve
apenas para representar algo completamente diferente de sua visão.
Pense bem no que você está fazendo. Reflita sobre suas ações e
movimentos. Por que você treina ? Pelo que você aceita correr riscos ? Seja
honesto com você mesmo quando estiver respondendo essas perguntas. E descubra
se aquilo que você está fazendo está realmente alinhado com uma filosofia
positiva e significativa. Não pense que você é livre e forte por você ter
realizado seu novo grande salto e colocado isso no Youtube, ou por ter
conseguido um patrocínio de uma marca qualquer.
Eu estive calado até agora e talvez eu tenha perdido alguns ‘’amigos’’
do facebook com essas palavras, mas eu sinto que devo falar tudo isso; pois
aquilo que nós estivemos treinando antes está morrendo e sendo substituído por
uma piada. Por algo sem
profundidade e significado. Eu penso muito nos praticantes sérios que existem
no mundo para estar compartilhando esse pensamento, e encorajo todos vocês a
estarem se expressando e falando cada dia mais alto !
Artigo original em : http://www.parkourgenerations.com/article/split